por Marsílea Gombata - Carta capital, SP
Porto Principe, 07 de agosto de 2014, Cenários distintos, Rio de Janeiro e Porto Príncipe carregam em comum um histórico de violência urbana, em meio à batalha pela disputa de territórios nas áreas mais favelizadas das duas cidades.
Apesar de os conflitos terem motivações diferentes – enquanto as favelas do Rio são disputadas por narcotraficantes, as de Porto Príncipe são rivalizadas por grupos de tendências políticas opostas – há quem diga que entender a realidade de uma cidade ajudou na busca por soluções dos problemas da outra. A experiência que o Brasil adquiriu no Haiti, defendem especialistas, contribuiu diretamente para o know how que originou em 2008 as chamadas Unidade de Polícia Pacificadora (UPPs).
A missão no Haiti foi uma chance para o Brasil treinar suas tropas, que sempre reclamaram da falta de investimento nas Forças Armadas. Foi, também, um exemplar laboratório para operações que visam à “garantia da lei e da ordem” nos morros do Rio, uma vez que os 1.200 militares brasileiros estão engajados em uma estratégia de ocupação contínua em áreas antes dominadas por gangues.
Segundo o tenente coronel Carlos Cavalcanti, do Centro Conjunto de Operações de Paz do Brasil (CCOPAB), a Missão das Nações Unidas para a estabilização no Haiti (Minustah) iniciou sua ofensiva em Cité Soleil em 2005, sob o comando do general Heleno Pereira e com o novo conceito de ocupação permanente de “pontos fortes” – enclaves localizados no coração da área considerada mais perigosa, e de onde as operações de pacificação partiriam para ampliar o perímetro de segurança. “Os resultados culminaram com a pacificação de Cité Soleil e, posteriormente, de Cité Militaire em 2007. A Polícia Militar do Rio de Janeiro, inclusive, enviou uma comitiva ao Haiti quando essas operações ainda estavam sendo executadas, com o objetivo de coletar as experiências do Exército Brasileiro”, lembra Cavalcanti.
Especialista em defesa e inserção do Brasil do programa de pós-graduação em Relações Internacionais da Universidade do Estado do Rio de Janeiro (Uerj), Cláudio Silveira afirma que a experiência no Haiti inspirou a política das UPPs, pois “legitima a participação do Exército” nessas operações. “A instalação das UPPs pega o melhor da expertise em relação ao controle de distúrbios urbanos, contra uma ideia de ameaça ao Estado e de constituição de grupos que são quase um Estado paralelo”, observa. “As Forças Armadas também têm participação na chamada ‘garantia da lei e da ordem’. E isso, ao meu ver, é um problema sério que respalda o intervencionismo militar.”
Em maio de 2013, o então governador do estado do Rio, Sérgio Cabral (PMDB), e o primeiro-ministro haitiano, Laurent Lamothe, assinaram um acordo de cooperação entre a PM do Rio e a Polícia Nacional Haitiana (PNH) para a troca de informações sobre a evolução da política de UPPs no Rio, em comparação com os “pontos fortes” nas favelas haitianas. Dois meses mais tarde, uma comissão da PNH viajou ao Rio para conhecer novas UPPs, assim como o treinamento do Batalhão de Operações Policiais Especiais (Bope) e do Batalhão de Choque.
O Haiti teve seu Exército desmantelado nos anos 1990. O país já foi ocupado duas vezes pelos Estados Unidos no passado, e hoje luta para reestruturar sua polícia (com cerca de 11 mil homens). Sob a tutela da Minustah, tem em seu país 5.165 militares e 2.466 agentes de polícia estrangeiros para a segurança pública. A missão, que é vista de modo cético por movimentos sociais da região e militantes da esquerda haitiana, esteve envolta em polêmicas. Entre elas, denúncias de abusos sexuais de crianças e suspeitas de transmissão de cólera por soldados nepaleses que compunham o contingente estrangeiro.
O principal propósito da missão, que já custou ao Brasil 2,11 bilhões de reais (sendo 741 milhões de reais reembolsados pela ONU) era projetar a PNH como a principal força de segurança, assessorados pela UNPOL (Polícia da ONU) e pelo componente militar da missão. O objetivo, segundo o capitão Leonardo Sampaio, responsável pela 2ª Cia de Infantaria de Força de Paz, em Cité Soleil, foi conquistado apenas parcialmente. “O policial haitiano ainda não se sente seguro para atuar em determinadas áreas. Eles dizem que se a gente saísse agora, o sistema falharia”.
O Haiti luta contra o tempo para fortalecer suas forças de segurança, já que o cronograma da ONU prevê a retirada gradual até 2016 de todos os militares estrangeiros. Quando o país conseguirá retirar totalmente de cena a UNPOL e o componente militar da Minustah para a PNH andar com as próprias pernas, no entanto, permanece incerto.
De Porto Príncipe
Cenários distintos, Rio de Janeiro e Porto Príncipe carregam em comum um histórico de violência urbana, em meio à batalha pela disputa de territórios nas áreas mais favelizadas das duas cidades.
Apesar de os conflitos terem motivações diferentes – enquanto as favelas do Rio são disputadas por narcotraficantes, as de Porto Príncipe são rivalizadas por grupos de tendências políticas opostas – há quem diga que entender a realidade de uma cidade ajudou na busca por soluções dos problemas da outra. A experiência que o Brasil adquiriu no Haiti, defendem especialistas, contribuiu diretamente para o know how que originou em 2008 as chamadas Unidade de Polícia Pacificadora (UPPs).
A missão no Haiti foi uma chance para o Brasil treinar suas tropas, que sempre reclamaram da falta de investimento nas Forças Armadas. Foi, também, um exemplar laboratório para operações que visam à “garantia da lei e da ordem” nos morros do Rio, uma vez que os 1.200 militares brasileiros estão engajados em uma estratégia de ocupação contínua em áreas antes dominadas por gangues.
Segundo o tenente coronel Carlos Cavalcanti, do Centro Conjunto de Operações de Paz do Brasil (CCOPAB), a Missão das Nações Unidas para a estabilização no Haiti (Minustah) iniciou sua ofensiva em Cité Soleil em 2005, sob o comando do general Heleno Pereira e com o novo conceito de ocupação permanente de “pontos fortes” – enclaves localizados no coração da área considerada mais perigosa, e de onde as operações de pacificação partiriam para ampliar o perímetro de segurança. “Os resultados culminaram com a pacificação de Cité Soleil e, posteriormente, de Cité Militaire em 2007. A Polícia Militar do Rio de Janeiro, inclusive, enviou uma comitiva ao Haiti quando essas operações ainda estavam sendo executadas, com o objetivo de coletar as experiências do Exército Brasileiro”, lembra Cavalcanti.
Especialista em defesa e inserção do Brasil do programa de pós-graduação em Relações Internacionais da Universidade do Estado do Rio de Janeiro (Uerj), Cláudio Silveira afirma que a experiência no Haiti inspirou a política das UPPs, pois “legitima a participação do Exército” nessas operações. “A instalação das UPPs pega o melhor da expertise em relação ao controle de distúrbios urbanos, contra uma ideia de ameaça ao Estado e de constituição de grupos que são quase um Estado paralelo”, observa. “As Forças Armadas também têm participação na chamada ‘garantia da lei e da ordem’. E isso, ao meu ver, é um problema sério que respalda o intervencionismo militar.”
Em maio de 2013, o então governador do estado do Rio, Sérgio Cabral (PMDB), e o primeiro-ministro haitiano, Laurent Lamothe, assinaram um acordo de cooperação entre a PM do Rio e a Polícia Nacional Haitiana (PNH) para a troca de informações sobre a evolução da política de UPPs no Rio, em comparação com os “pontos fortes” nas favelas haitianas. Dois meses mais tarde, uma comissão da PNH viajou ao Rio para conhecer novas UPPs, assim como o treinamento do Batalhão de Operações Policiais Especiais (Bope) e do Batalhão de Choque.
O Haiti teve seu Exército desmantelado nos anos 1990. O país já foi ocupado duas vezes pelos Estados Unidos no passado, e hoje luta para reestruturar sua polícia (com cerca de 11 mil homens). Sob a tutela da Minustah, tem em seu país 5.165 militares e 2.466 agentes de polícia estrangeiros para a segurança pública. A missão, que é vista de modo cético por movimentos sociais da região e militantes da esquerda haitiana, esteve envolta em polêmicas. Entre elas, denúncias de abusos sexuais de crianças e suspeitas de transmissão de cólera por soldados nepaleses que compunham o contingente estrangeiro.
O principal propósito da missão, que já custou ao Brasil 2,11 bilhões de reais (sendo 741 milhões de reais reembolsados pela ONU) era projetar a PNH como a principal força de segurança, assessorados pela UNPOL (Polícia da ONU) e pelo componente militar da missão. O objetivo, segundo o capitão Leonardo Sampaio, responsável pela 2ª Cia de Infantaria de Força de Paz, em Cité Soleil, foi conquistado apenas parcialmente. “O policial haitiano ainda não se sente seguro para atuar em determinadas áreas. Eles dizem que se a gente saísse agora, o sistema falharia”.
O Haiti luta contra o tempo para fortalecer suas forças de segurança, já que o cronograma da ONU prevê a retirada gradual até 2016 de todos os militares estrangeiros. Quando o país conseguirá retirar totalmente de cena a UNPOL e o componente militar da Minustah para a PNH andar com as próprias pernas, no entanto, permanece incerto.
Nenhum comentário:
Postar um comentário